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8 de agosto de 2016

Poema: A Flor e a Náusea

Preso à minha classe e a algumas roupas, vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias, espreitam-me.
Devo seguir até o enjoo?
Posso, sem armas, revoltar-me?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.

Vomitar este tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

Carlos Drummond de Andrade

27 de junho de 2016

Minha História com os Quadrinhos

 
Há muito tempo, nos idos da década de 1980, eu encontrei um gibi no lixo, era um Almanaque do Cascão sem capa, eu ainda estava aprendendo a ler e de imediato fiquei hipnotizado por aquela obra. Folheava o gibi extasiado e me encantava com cada página, com cada quadrinho, lia e relia aquela relíquia sem parar. Pode parecer exagero a forma como descrevo o meu primeiro contato com o mundo dos quadrinhos, mas na verdade não tem nada de exagero, nascia ali uma grande paixão.

Meu pai logo percebeu meu encantamento com os gibis e, para meu deleite, me presenteou com algumas revistas novinhas. Então os personagens impressos naquelas folhas de papel tornaram-se meus amigos inseparáveis. Eu gostava de tudo, mas os preferidos eram a turma da Mônica (principalmente o Cascão) e os personagens Disney.

Eu estava sempre pedindo para meu pai comprar novos gibis e todo dinheiro que eu ganhava era destinado à esse fim. Um dos meus maiores prazeres era conseguir juntar alguns trocados, pegar minha Monareta vermelha e pedalar a toda velocidade em direção à única banca da pequena cidade mineira em que morávamos durante minha infância e adolescência.

Consegui reunir uma coleção considerável, bastante variada, mas formada principalmente por Turma da Mônica e Disney, mas que também contava com Os Trapalhões, Recruta Zero, Bolinha e Luluzinha e outros. Tinha um pouco de DC e Marvel também, mas naquela época eu não gostava muito de comprar quadrinhos de super-heróis porque as histórias quase sempre continuavam em outras edições, os gibis não traziam histórias fechadas e eu não sabia quando teria dinheiro para voltar à banca, por isso não dava para acompanhar esse universo.

Mas o tempo foi passando e com a adolescência surgiram outras paixões, outras prioridades, outros passatempos e aos poucos fui deixando os quadrinhos de lado. Um dia, quando eu tinha dezoito anos de idade, nos mudamos para outra cidade e a minha preciosa coleção se perdeu para sempre, ficou esquecida nas gavetas de um móvel velho que eu nunca mais veria.

No início não me importei muito, mas conforme o tempo foi passando comecei a sentir falta daqueles gibis que fizeram parte da minha infância, que me acompanharam por tanto tempo e que me fizeram tão feliz. Voltei aos poucos ao hábito da leitura, mas com livros e não com quadrinhos, pois não era mais criança e deveria ler “coisas de adulto”. Ali nasceu uma nova paixão, passei a ler cada vez mais e hoje tenho uma bela coleção de livros dos mais variados gêneros: ficção, história, biografia, poesia, crônicas etc.

Contudo, sempre batia um sentimento de nostalgia em relação aos quadrinhos e um dia, há sete anos, passando em frente a uma banca de revistas me deparei com um gibi que trazia na capa o Zé Carioca, o Panchito e o Pato Donald. Era o Disney Big número 4, uma revista de 308 páginas (foto abaixo). Resolvi comprar de forma meio desinteressada e, terminada a leitura, descobri que minha paixão pelos quadrinhos não tinha acabado, estava apenas adormecida e agora despertara.

Foi assim, depois de uns quinze anos longe desse universo, que voltei a apreciar essa arte tão lúdica e magnífica. Hoje tenho uma condição financeira que me permite comprar meus gibis com uma certa periodicidade e ampliar esse mundo de fantasia tão prazeroso. Descobri que sou um grande fã dos super-heróis da Marvel e da DC e do ranger Tex Willer, que ainda me divirto imensamente com as travessuras da turma do bairro do Limoeiro, que Calvin e Hobbes, Snoopy e Mafalda são quadrinhos geniais. Mas percebi que em primeiro lugar ainda estão as aventuras e trapalhadas dos personagens Disney.

Os quadrinhos hoje têm lugar cativo nas minhas prateleiras, abrilhantando minha coleção literária que só faz crescer, para desespero da minha esposa. Rsrs...